Professores enfrentam desafios para lidar com ataques virtuais

Quando a pandemia da Covid-19 começou e o ensino remoto se tornou a única alternativa pedagógica, não faltaram análises otimistas sobre o uso dos recursos digitais. Além de potencializar o aprendizado, esperava-se que a comunicação entre estudantes e professores fosse mais próxima e horizontal. Mas o que têm sido identificado por especialistas em educação e entidades sindicais é que os ambientes virtuais registram cada vez mais casos de violência e hostilidade. Também são lugares favoráveis para disseminação de discursos de ódio, que podem resultar em agressões presenciais. Nos dois casos, professores são alvos comuns e precisam lidar com as consequências na saúde física e mental.

Queixas do tipo aumentaram no Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação do Estado do Rio de Janeiro (Sepe). A coordenadora Helenita Beserra diz que estudantes e responsáveis têm utilizado as redes sociais dos professores ou contatos diretos via whatsapp para os desrespeitar e os atacar.

“Temos aqui um grupo grande de profissionais que está se sentindo perseguido. Entram nas redes sociais deles para fazer patrulhamento da posição política e contestam de forma agressiva as publicações ali. Esses casos estão se tornando corriqueiros e os profissionais estão sofrendo com essa pressão psicológica e o estresse”, diz Helenita.

Há algumas semanas, profissionais do Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro, denunciaram que uma professora de inglês levou tapas de um aluno por causa de um desafio publicado na rede social Tik Tok. Outros casos comuns de violência envolvem linchamentos virtuais, cyberbullying e gravações não autorizadas com o objetivo de humilhar os profissionais.

Quando o professor é vítima dessas agressões, a orientação sindical é procurar as autoridades competentes para que agressor ou pais sejam responsabilizados.

“Em casos mais graves contra os profissionais, colocamos o departamento jurídico à disposição para ajudá-los a fazer esse enfrentamento. Quando a situação é ainda mais delicada, o correto é procurar uma delegacia para fazer o registro policial. De preferência alguma especializada em crimes cibernéticos”, orienta Helenita.

Motivações

Violências contra professores têm diferentes motivações. Quando se trata especificamente do ambiente virtual, o pesquisador Antônio Álvaro Soares Zuin tem uma tese para explicar uma das dimensões que explicam a hostilidade de estudantes contra professores.

No livro “Cyberbullying contra professores”, lançado em 2017, o professor do departamento de educação da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) argumenta que vivemos em uma “era da concentração dispersa” impulsionada pelas tecnologias de comunicação. Nesse contexto, os alunos projetam uma espécie de rivalidade entre dispositivos digitais e os professores.

“Desde os primórdios das relações ensino-aprendizagem, os professores foram responsáveis pela manutenção do foco de atenção dos alunos em relação aos conteúdos. Várias metodologias foram desenvolvidas para garantir isso. Desde a via dialógica até a aplicação de punições físicas e psicológicas. Hoje em dia, é preciso um esforço muito grande para manter a atenção e ler qualquer conteúdo em profundidade, uma vez que queremos ficar conectados aos celulares o tempo todo” argumenta Zuin.

“Para os alunos, vai ficando absolutamente insuportável focar durante horas numa figura como o professor. E aí, eles acabam, de certa maneira, se vingando contra essa figura que historicamente foi responsável pela manutenção da atenção deles”, completa.

Quando a escola não favorece o diálogo, silencia estudantes e o professor se coloca como uma figura autoritária, casos de violência podem ser potencializados. A análise é de Telma Brito Rocha, doutora em educação e professora da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Ela é autora do livro “Cyberbullying: ódio, violência virtual e profissão docente”, de 2012.

“Sabemos que o professor sofre com uma série de violências cotidianas. Mas também é preciso entender como as agressões dos estudantes podem ser ressonâncias de práticas escolares”, diz Telma. “Essa violência vem muitas vezes do professor, que imprime uma perseguição por causa de determinados comportamentos dos alunos em sala de aula. Existe a repressão em relação a como o aluno se senta, como fala, como se veste, como deve se portar e estar no ambiente. Isso tudo acaba por gerar revoltas, que por sua vez podem gerar outras violências”.

Caminhos alternativos

Os dois pesquisadores entendem que para combater as agressões contra professores, sejam nos ambientes presenciais ou virtuais, é preciso transformar a escola em lugar permanente de diálogo e resolução de conflitos. Em outras palavras, dar mais espaço para que os alunos expressem sejam ouvidos e expressem insatisfações.

“O espaço educacional é um espaço de conflito e cooperação. Não é um lugar sempre tranquilo, onde as pessoas vão sorrir o tempo todo. A gente tem que buscar a via pedagógica para resolver os problemas. Não é eliminar o aluno que agrediu, enviar para outro colégio e transferir o problema. Precisamos que o poder público, as secretarias de educação, invistam em equipes multidisciplinares. O problema exige cada vez mais estratégias que possam dar conta dessa complexidade e envolver diferentes áreas do conhecimento”, diz Telma Brito Rocha.

“O professor tem que redimensionar o significado da autoridade educacional. Principalmente no sentido de realizar uma espécie de autocrítica, de não querer persuadir o aluno que ele é o dono da verdade. Além disso, a escola deveria promover espaços e situações em que professores, alunos e pais possam se reunir e tentar entender o porquê de estar acontecendo alguma violência, para tentar estabelecer determinadas ações conjuntas. Se houver um espaço propício para esses contratos sociais pedagógicos, a prática de cyberbullying tende a cair”, diz Antônio Zuin.

Educação digital na infância

Projetos que desenvolvem uma educação digital direcionada para crianças e jovens também podem ser caminhos de prevenção e combate à violência na internet. É o caso do programa criado pela professora Maria Sylvia Spínola, chamado de “Educação midiática na prática”. Ele é voltado para crianças do 5º ano, que tem em média 10 ou 11 anos de idade, nas salas de aula da rede pública onde ela leciona. Mestre em ensino e educação na área de tecnologias digitais, Maria Sylvia trabalha principalmente a formação do senso crítico e da responsabilidade nos ambientes virtuais.

Os aprendizados incluem o uso dos mecanismos de busca, checagem de fatos, diferenciar opinião de informação, e como se comportar de forma crítica e ética nas redes sociais.

“Quando a gente trabalha questões de bullying, golpe, assédio ou violências que acontecem na internet, as crianças muitas vezes conseguem perceber quando elas são vítimas. Mas elas não conseguem perceber quando elas estão sendo agressivas ou usando linguagens impróprias. Eu trabalho em cima dessa perspectiva também”, explica a professora. “Considerando que a educação midiática tem como base a formação da cidadania, que ajuda no bom uso das ferramentas e em como se expressar de maneira responsável, acredito que estamos contribuindo na construção de um cidadão ético”.

A professora reforça, no entanto, que as instituições de ensino não são as únicas responsáveis por prevenir violências e comportamento inadequados dos estudantes nas redes. É preciso engajar toda a sociedade nesse processo.

“A gente precisa considerar todas as questões sociais, emocionais, e os ambientes familiares. Muitas crianças não têm orientação parental sobre o bom uso da internet, não estão envolvidas em práticas seguras”, reforça Maria Sylvia. “A escola é muito cobrada como parte responsável por educar a sociedade, e a gente esquece a importância de envolvimento da família e do poder público. É aquela máxima, não se educa uma criança sem o movimento de uma aldeia inteira”.

Fonte: Agência Brasil

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