“Fui encaminhado pelos médicos da UBS [unidade básica de saúde] perto de casa, por causa da diabetes; eles me mandaram para cá porque minha diabetes era incontrolável, não tinha jeito de estabilizar”, relata Carlos de Sousa, 52 anos, morador do Itapoã. No Centro de Atenção ao Diabetes e Hipertensão Adulto (Cadh), do Hospital Regional do Paranoá, ele finalmente conseguiu controlar as taxas da doença, com o apoio de uma equipe multiprofissional que o acompanha regularmente.
Atualmente, o Distrito Federal conta com quatro centros de atenção a diabetes e hipertensão, nas modalidades Adulto (Cadh) e Infantil (Cadhin), distribuídos pelas regiões de saúde. Neste mês, o Governo do Distrito Federal (GDF) inaugurou o posto que abrange Ceilândia, Brazlândia, Sol Nascente/Pôr do Sol. As unidades atendem usuários de alto e muito alto riscos, com diagnóstico de diabetes ou hipertensão, encaminhados pelas equipes de Saúde da Família. Somente neste ano, já foram prestados mais de 18 mil atendimentos.
A coordenadora de Atenção Secundária e Integração de Serviços da Secretaria de Saúde (SES-DF), Juliana Oliveira, explica que a Atenção Ambulatorial Especializada (AAE) atua como retaguarda dos demais níveis de atenção, especialmente da Atenção Primária à Saúde (APS). “No DF, seu papel central inclui realizar consultas e procedimentos especializados, que cobrem especialidades médicas, pequenas cirurgias ambulatoriais, exames complementares de média complexidade e ações de reabilitação; e receber pacientes referenciados pela APS quando o manejo clínico exige especialistas, infraestrutura ou tecnologias não disponíveis nas UBSs”, esclarece.
Atendimento especializado
Na Região de Saúde Leste, que atende São Sebastião, Paranoá, Itapoã e Jardim Botânico, a unidade é estruturada para oferecer um atendimento completo ao paciente com diabetes e hipertensão, com foco especial no cuidado ao diabético. Uma das principais complicações da doença são as lesões nos pés, o que motivou a criação da chamada Sala do Pé, vinculada ao Cadh. O espaço conta com uma equipe especializada composta por enfermeira, médico e podólogo, que atuam de forma integrada no tratamento de usuários com lesões ativas.
O atendimento segue protocolos modernos, utilizando metodologias reconhecidas internacionalmente, como a técnica indiana de descompressão de calcâneo com o uso de palmilhas e a laserterapia, além de curativos e coberturas especiais. Os resultados têm sido considerados excepcionais, com redução significativa de amputações e melhora no processo de cicatrização.
Com o sucesso do modelo e a percepção das dificuldades enfrentadas por pacientes de regiões mais distantes, especialmente os que vivem em São Sebastião, foi inaugurada, em 2020, uma segunda Sala do Pé e Feridas Complexas na Policlínica de São Sebastião. “Muitos desses usuários têm lesões graves, que comprometem a locomoção e exigem cuidados frequentes”, explica a diretora da Atenção Secundária da Região de Saúde Leste, Jane Franklin. “A descentralização do atendimento aproximou o serviço e garantiu continuidade ao tratamento”.
Como funciona
“O usuário não sai com receitas genéricas ou orientações padronizadas, mas com metas específicas para atingir a estabilização clínica. Se, por exemplo, o maior problema identificado for um luto recente, o plano vai priorizar o acolhimento psicológico, não apenas o ajuste medicamentoso”
Mayara Batista, gerente de Planejamento e Monitoramento da Diretoria de Agenção Secundária da Região Leste de Saúde
Segundo a gerente de Planejamento e Monitoramento da Diretoria de Atenção Secundária da Região de Saúde Leste, Mayara Batista, todo o processo começa na UBS. “A unidade básica faz a territorialização e a estratificação de risco”, pontua. “Quando identifica usuários que se enquadram nos critérios estabelecidos, o cuidado é compartilhado com o serviço especializado. Não se fala em encaminhamento, porque a comunicação com a APS continua o tempo todo. No DF, usamos o Sisreg [Sistema de Regulação] para esse acompanhamento, com o objetivo de garantir que o usuário tenha acesso ao serviço em até 30 dias”.
No Cadh, o atendimento se dá de forma integrada. Ao chegar, o paciente é acolhido e passa por um ciclo de atendimentos, conforme a regulação. Ele é acompanhado por uma equipe multiprofissional formada por psicólogo, nutricionista, enfermeiro, médicos (endocrinologista e/ou cardiologista, conforme o caso), farmacêutico clínico e outros especialistas. Todo o fluxo segue a metodologia da planificação, que organiza os processos de trabalho das unidades de saúde e promove a integração das atenções Primária e Especializada.
Ao final do turno, todos os profissionais se reúnem para discutir o caso do paciente e elaborar um documento chamado plano de cuidado. “Esse é o diferencial”, aponta Mayara Batista. “O usuário não sai com receitas genéricas ou orientações padronizadas, mas com metas específicas para atingir a estabilização clínica. Se, por exemplo, o maior problema identificado for um luto recente, o plano vai priorizar o acolhimento psicológico, não apenas o ajuste medicamentoso”.
Além do público adulto, o centro também atende crianças com diabetes tipo 1, que permanecem vinculadas ao serviço até os 18 anos. Elas passam pelo mesmo ciclo e, conforme a necessidade, podem ter acesso à carteira ampliada ou avançada de serviços, com especialistas do hospital de referência.
Atendimento infantil
A partir de 2021, a equipe da Atenção Secundária da Região de Saúde Leste iniciou outro projeto: o Centro de Atenção Materno-Infantil (Cami). Durante a pandemia de covid-19, um levantamento de indicadores mostrou que a Região de Saúde Leste apresentava uma das maiores taxas de mortalidade infantil do Distrito Federal. Diante desse cenário, foi desenvolvido um plano de reestruturação do cuidado às gestantes de alto risco e às crianças de até dois anos, faixa etária mais vulnerável.
O atendimento materno no Cami começou em 2025, com base na mesma lógica de cuidado integrado e multiprofissional. “Hoje, as gestantes de alto risco chegam mais estáveis aos centros obstétricos, o que reduz as intercorrências durante o parto e melhora o estado de saúde dos recém-nascidos”, relata a diretora Jane Franklin. Como consequência, diminuiu a necessidade de internações em unidades intermediárias ou de terapia intensiva neonatal.
Atualmente, a equipe trabalha na estruturação do atendimento infantil, voltada ao segmento de bebês prematuros, de baixo peso ou com comorbidades, especialmente aqueles que necessitam de cuidados intensivos logo após o nascimento. Esses pacientes são acompanhados desde os primeiros 30 dias de vida por uma equipe multiprofissional formada por neonatologista, fonoaudiólogo, fisioterapeuta e nutricionista, com o objetivo de garantir intervenções precoces e melhorar os indicadores de saúde e sobrevivência infantil na região.
Reconhecimento
As equipes do centro são referência nacional e recebem visitas técnicas de forma recorrente, segundo Jane Franklin. “Nós somos considerados centro colaborador do Conass [Conselho Nacional de Secretários de Saúde], então praticamente todos os meses recebemos equipes de outros estados interessadas em conhecer a metodologia de planificação”, explica. A última visita, segundo ela, foi de uma equipe do Maranhão, há cerca de 30 dias.
Essas visitas são articuladas pelo Conass, que aciona o responsável pelo Programa Nacional de Humanização (PNH), dentro do qual está inserida a planificação. “Eles entram em contato conosco, enviam um QR Code com as informações básicas da equipe visitante e o objetivo da visita, já que há diferentes abordagens possíveis; a partir daí, organizamos o cronograma de recepção”, detalha.
Normalmente, as equipes passam um dia inteiro em visita técnica. “Eles começam acompanhando o atendimento na Atenção Primária, para entender a entrada do usuário no sistema, e depois seguem para o CAD, onde observam o funcionamento da Atenção Secundária e o trabalho integrado das equipes multiprofissionais”, explica a diretora.
